Publicado por: Rogério Tomaz Jr. | 06/01/2010

Erundina e a vitória da mobilização social

Luiza Erundina, deputada federal (PSB-SP), foi condenada a pagar R$ 350 mil aos cofres públicos, por conta de uma ação judicial que remonta ao tempo em que foi prefeita de São Paulo.

Trata-se da única condenação que Erundina registra em toda a sua vida – com 75 anos de vida e 51 de luta política.

A ação popular cobrava o ressarcimento dos recursos utilizados durante a greve geral de 89, durante a qual foram impressos cartazes e comprados espaços nos jornais para divulagação de mensagens da prefeitura, inclusive de apoio à greve.

Diante da sentença final, contra a qual não cabia mais recurso, entidades e amigos de Erundina se mobilizaram para levantar o montante determinado pela Justiça.

Ao contrário de Malufs, Pittas, Jânios e Sarneys da vida, os únicos bens que Erundina acumulou ao longo da carreira foram um apartamento na capital paulista, avaliado em R$ 80 mil, e dois carros populares, um Palio 97 e um Gol 2004.

Vários jantares, eventos e campanhas de doação foram organizados nos últimos meses de 2009.

Erundina durante o jantar realizado em Brasília(DF)

A novidade é que a quantia foi arrecadada e Erundina não terá mais com o que se preocupar em relação à Justiça.

Mais do que uma vitória pessoal e merecida de Erundina, foi uma vitória da mobilização social.

A vitória da mobilização social (leia)

Vale a pena ler o agradecimento da própria Erundina:

Agradecimento por uma ação coletiva de solidariedade política

por Luiza Erundina

Fim de ano é tempo propício à reflexão sobre o que passou, sobre o caminho percorrido e as perspectivas para o futuro.

Entre os acontecimentos que marcaram o ano de 2009, destacaria um fato inusitado, de profundo significado político, que nos surpreendeu a todas e todos, sugerindo que algo novo e transformador começa a despontar na sociedade brasileira, relacionado à política. Refiro-me ao extraordinário e espontâneo movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas pelo país afora que, movidas por forte sentimento de justiça, se mobilizaram para reparar uma injustiça de que eu fui vítima. É incompreensível que exatamente quem sempre se comportou, como era do meu dever, de forma ética e absolutamente fiel aos meus compromissos com a população, esteja sendo punida com tanto rigor.

Suponho que, além do sentimento de justiça, um outro teria motivado tão amplo e plural movimento de solidariedade, que seria o de indignação diante de um fato insólito na história política brasileira, ou seja, minha condenação, pelo Poder Judiciário, a pagar uma dívida à Prefeitura de São Paulo de mais de R$350 mil reais, correspondentes ao valor reajustado, ao longo de vinte anos, da publicação, em alguns jornais, de uma nota informando à população sobre a posição do governo a respeito da greve geral dos trabalhadores, ocorrida em março de 1989.

Foi uma decisão de um governo eleito pelas e pelos trabalhadores e que tinha compromissos claros com eles e com os setores populares da sociedade.

Além disso, na época vivia-se uma conjuntura caracterizada por desemprego, arrocho salarial e inflação superior a 80%, exigindo, portanto, posicionamento claro a respeito de que lado se estava. Se do lado do governo federal, cuja política econômica impunha enormes sacrifícios aos trabalhadores, ou do lado destes, apoiando suas justas e legítimas reivindicações. E o nosso Governo optou por esta posição, pois tinha lado. Não era neutro, até porque a neutralidade não existe, pois ela sempre serve ao interesse de um dos lados em disputa.

Tenho refletido e procurado julgar a mim mesma sobre aquela decisão e cheguei à conclusão de que era exatamente a que deveríamos tomar. E mais do que isso estou convencida de que, em situação semelhante, assumiríamos a mesma posição, fossem quais fossem os riscos que tivéssemos que correr.

Aquela condenação provocou, como se viu, perplexidade e indignação em muita gente, resultando em um movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas, grupos, organizações populares, empresários, lideranças sindicais, parlamentares, dirigentes e militantes dos mais diversos partidos políticos; lideranças religiosas e de movimentos sociais e tantos outros que de forma anônima materializaram seu apoio depositando na “Conta:Luiza, apóio você” importâncias de dois, cinco, vinte, cinqüenta ou até valores de milhares de reais, o que possibilitou o “milagre” que só a solidariedade generosa e desinteressada é capaz de operar. O fato é que hoje, 4 de janeiro de 2010, já dispomos do montante suficiente para saldar essa dívida que a justiça me impôs.

Como explicar tão surpreendente reação? Senso de justiça? Afirmação e valorização da ética na política? Que lição tirar de tudo isso?

Gestos de tamanha generosidade e solidariedade, não só me comovem, profundamente, como também me dão a certeza de que a política é mais do que a organização de pessoas em torno de um projeto de poder que disputa com outros projetos de poder, mas, a política é também ação coletiva de sujeitos livres que, juntos, constroem a cidade de todas e todos, como espaço de convivência fraterna e democrática.

Finalmente, desejo expressar minha profunda gratidão a todas e todos que, de forma anônima e generosa, e muitos até com sacrifício, me ajudaram a sair da situação constrangedora em que me encontrava.

Com os meus cumprimentos de fim de ano, formulo votos para que 2010 seja pleno de paz e de grandes realizações.

Com abraços afetuosos.

Luiza Erundina


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