O deputado estadual Ney Leprevost (PP-PR) apresentou, ontem (11), na Assembleia Legislativa do Paraná, um projeto de lei que mostra o quão democráticos são os “defensores da liberdade de imprensa” alinhados à mídia conservadora — cujos porta-vozes (inclusive no parlamento) e cAlunistas gritam “morte aos fanáticos” para desqualificar quem pensa diferente.
O PL leva o número 474/2010 e pode ser encontrado no site da Assembleia.
A ementa do projeto diz o seguinte:
Estabelece a impossibilidade de criação de comitês ou órgãos semelhantes que tenham por finalidade o controle da imprensa escrita, falada ou televisionada no estado do Paraná.

"A liberdade de imprensa é nossa e ninguém tasca!", poderia dizer Leprovost. (Foto: site do parlamentar)
O deputado é desinformado e muito mal assessorado.
Para justificar o PL, Leprevost usa matéria do jornal espanhol El País que considera a criação de conselhos estaduais de comunicação (citando CE, PI, BA, AL e SP) um “artifício do governo para controlar os meios de comunicação” (não li a matéria, a citação é extraída do PL).
O deputado eu tenho certeza que desconhece, mas é curioso constatar que o jornal ignora — ou finge ignorar — a existência, em seu próprio país, da Comissão do Mercado de Telecomunicações (CMT), órgão regulador da comunicação na Espanha.
Pior ainda, o jornal ignora a aprovação, no último 31 de março, da Lei Geral da Comunicação Audiovisual da Espanha.
Entre muitos outros princípios e dispositivos interessantes e promotores do direito à comunicação (inclusive de segmentos específicos da população), a Lei diz:
Artículo 9. El derecho a la participación en el control de los contenidos audiovisuales.
1. Cualquier persona física o jurídica puede solicitar a la autoridad audiovisual competente el control de la adecuación de los contenidos audiovisuales con el ordenamiento vigente o los códigos de autorregulación.
Esse trecho, aliás, publiquei aqui no blog na terça-feira (9).
Se o deputado e/ou sua assessoria tivessem mais disposição em respeitar a inteligência dos cidadãos e cidadãs paranaenses e brasileiros(as), talvez tivessem evitado o mico de apresentar uma proposta tão ridícula e inócua, cujo objetivo é mais ganhar os holofotes da mídia do que atender ao interesse público.
Ney Leprevost e sua assessoria também não entendem bulhufas sobre o conceito de “controle público e social da mídia”. E também falei disso no post de terça-feira:
A rigor, controle público e social, ao contrário do que acusam as carolas anticomunistas das redações, é uma ideia situada precisamente nos marcos do liberalismo: baseia-se no princípio da soberania popular — “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”, diz a nossa Carta Magna de 1988. Pretendo detalhar essa formulação em artigo para breve.
No e-mail de divulgação, a assessoria do deputado fala em projeto “contra a lei da mordaça”.
Ademais, órgãos como a CMT da Espanha existem há várias décadas nos EUA, Canadá, França, Inglaterra, Alemanha, Portugal, Itália, Suécia, Noruega, FInlândia, Japão, Austrália, Nova Zelândia, Chile, Argentina e muitos outros.
Como o deputado sabe, todos estes países são ditaduras comunistas sangrentas e impiedosas, onde não existe qualquer liberdade de imprensa ou de expressão.
Além de ganhar os holofotes da mídia, o deputado talvez acredite que possa interditar o debate com esse factóide. Ledo engano. E nisso reside o caráter autoritário do PL.
É sempre assim. Desde a Grécia Antiga até o Brasil do século XXI, os que mais se autointitulam defensores da liberdade da palavra são os que mais a ameaçam e a violam no cotidiano.
*A nova lei da Espanha está disponível no link abaixo:
http://www.derecho.com/l/boe/ley-7-2010-general-comunicacion-audiovisual
**O Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social fez pesquisa sobre a regulação da mídia em 10 países. Confira:
Dominique Wolton defende a emancipação, o lado humano e social da comunicação e a defesa da comunicação como elemento central da democracia e diz o seguinte:
“A lei não constitui o obstáculo para a liberdade de comunicação, mas sua condição. Não haverá liberdade de comunicação sem lei para protegê-la. A exceção cultural constitui para amanhã um desafio político mundial. A ação do Estado, na defesa do interesse geral, contra os interesses particulares, também é uma condição para que a informação e a comunicação, além da performance das técnicas e dos mercados, permaneçam um valor de emancipação”.
(No prefácio à edição brasileira de “Pensar a comunicação”, p. 20).
By: Tassia Arouche Patricio on 15/11/2010
at 16:56
Corrigindo:
Dominique Wolton defende a emancipação, o lado humano e social da comunicação e a comunicação como elemento central da democracia (…)
By: Tassia Arouche Patricio on 15/11/2010
at 16:58